O longa-metragem gaúcho Vento Norte, de Salomão Scliar (1925 – 1991), foi anunciado como um dos destaques da programação oficial da próxima edição do Festival Internacional de Cinema de Roterdã, na Holanda (https://iffr.com/en/iffr/2026/films/vento-norte). O evento será realizado de 29 de janeiro a 8 de fevereiro de 2026 e é considerado um dos cinco maiores do gênero na Europa. O filme vai ser exibido na mostra Cinema Regained, que reúne obras clássicas restauradas, documentários e produções experimentais sobre a cultura cinematográfica.
Será a estreia da versão restaurada em 4K do primeiro longa-metragem de ficção sonoro filmado no Rio Grande do Sul no início da década de 1950. O processo de digitalização está sendo realizado pela Cinemateca Capitólio, por meio da Secretaria Municipal de Cultura de Porto Alegre,em parceria com a Cinemateca Brasileira, de São Paulo. O projeto tem apoio da Link Digital e Mapa Filmes e coordenação técnica de restauração de Débora Butruce, da Mnemosine Serviços Audiovisuais.
Considerada o elo entre o neorrealismo italiano e o cinema novo brasileiro, a produção foi rodada em preto e branco na cidade de Torres, no litoral gaúcho. A trama retrata a rotina de uma pequena vila de pescadores abalada pela chegada de um misterioso forasteiro. A presença dele irá despertar paixões e desencadear uma série de ações violentas entre os habitantes locais, conduzindo a trama um desfecho trágico.
O longa foi montado no Rio de Janeiro, onde foi exibido pela primeira vez no Círculo de Estudos Cinematográficos do Rio de Janeiro, em janeiro 1951. Em maio do mesmo ano, teve sessões no Museu de Arte de São Paulo e no Clube de Cinema de Porto Alegre. Em julho, também entrou em cartaz no Cinema Imperial, na capital gaúcha.
Salomão Scliar acumulou as funções de diretor, roteirista, produtor, fotógrafo e still. A restauração digital da película acontece no ano em que é comemorado o centenário de nascimento do artista.
— Vento Norte é um filme pouco conhecido, visto em cópias VHS com baixíssima resolução ou para quem teve a sorte, visto em algumas poucas sessões realizadas em 35mm. É uma obra muito bem realizada e destaca uma região do Rio Grande do Sul pouco conhecida internacionalmente, como a Praia de Torres. Ele é um marco na história do cinema brasileiro por toda sua realização, e o único longa-metragem realizado por Salomão Scliar — explica Daniela Mazzilli,diretora da Cinemateca Capitólio e coordenadora de Cinema e Audiovisual da Secretaria Municipal da Cultura de Porto Alegre.
Além da projeção no Festival Internacional de Cinema de Roterdã, a versão digital de Vento Norte será exibida em outras mostras cinematográficas no ano que vem, como também na Cinemateca Capitólio.
>> SALOMÃO SCLIAR
Salomão Scliar (1925-1991) nasceu em Porto Alegre em uma família de vocação artística. Era irmão de Carlos Scliar (1920-2001), um dos mais importantes pintores brasileiros, e primo de Moacyr Scliar (1937-2011), escritor cuja obra foi traduzida em vários idiomas, e da pianista Esther Scliar (1926-1978). Ainda na juventude, transferiu-se para o Rio de Janeiro, onde teve suas primeiras experiências com cinema, atuando nos bastidores de produções dos estúdios Atlântida. De volta a Porto Alegre, realizou o primeiro curta da carreira, Homens ao Mar, em 1945.
Em 1948, fez a primeira viagem à Europa, como convidado oficial do governo holandês, para cobrir o jubileu da rainha Guilhermina e a coroação da rainha Juliana. Também cobriu a Guerra dos Seis Dias, em Israel, em 1967. Depois de fundar sua própria companhia produtora, a Horizonte Produções Cinematográficas, em 1949, lançou-se à produção de Vento Norte, primeiro longa-metragem de ficção sonoro realizado no sul do Brasil.
Paralelo a isso, consolidou uma respeitada carreira de fotógrafo de estúdio, e também como fotojornalista, colaborando com importantes publicações brasileiras e internacionais, como Life e Vogue.
— Salomão Scliar é uma importante figura da fotografia brasileira e realizou apenas este longa-metragem, Vento Norte. Concluir, em 2025, ano de seu centenário, a restauração do filme é colocar sua produção artística ainda mais em evidência, convidando a todos a conhecerem a trajetória deste artista — comemora Daniela Mazzilli.

>> FESTIVAL DE CINEMA DE ROTTERDAM
O Festival Internacional de Cinema Rotterdam é realizado anualmente em várias salas de exibição da segunda maior cidade holandesa. É um dos cinco principais eventos do gênero na Europa, juntamente com os festivais de Cannes, Veneza, Berlim e Locarno.
Cinema Regained é uma das principais mostras do Festival Internacional de Cinema de Rotterdam que redescobre e reexamina a história do cinema por meio de clássicos restaurados, achados de arquivo, novos documentários sobre a cultura cinematográfica e obras experimentais, oferecendo novas perspectivas sobre o passado do cinema, muitas vezes destacando cineastas esquecidos e celebrando o patrimônio cinematográfico.
>> CINEMATECA CAPITÓLIO
A Cinemateca Capitólio é um centro cultural dedicado à cinematografia e tem como missão a preservação, difusão e recuperação do material audiovisual do estado do Rio Grande do Sul. É administrada pela Coordenação de Cinema e Audiovisual da Secretaria de Cultura de Porto Alegre e ocupa o prédio histórico do antigo Cine-Theatro Capitólio, construído em 1928, na região central da capital gaúcha.
O espaço conta com sala de cinema pública, biblioteca especializada, áreas de pesquisa, sala multimídia, galeria de exposições e um acervo de mais de 60 mil itens, além de cafeteria e loja.
Desde 2023, a Cinemateca Capitólio promove a restauração de importantes filmes nacionais que são colocados novamente em circulação, como Um é Pouco, Dois é Bom (1970), de Odilon Lopez, cuja versão digital estreou em 2024 e já foi exibida em diversos países, como Argentina, Coreia do Sul, Portugal e Chile.

Jornalista, assessor de imprensa, apaixonado por cinema, artes e viagens.
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